segunda-feira, 8 de maio de 2017

sobre bolinhos de chuva salgados



não tenho frescura para comer. nunca tive e a esta altura da vida, nunca terei. poucos alimentos não me apetecem e mesmo os que não gosto, se apenas apenas eles estiverem sobre a mesa, tapo o nariz e mando para dentro. mas se puder, não como: berinjela, abobrinha, giló e quiabo. alias, esse quiabo é uma coisa medonha. uma comida com uma baba, um ranço... como pode? mas se tiver só quiabo, fazer o que?

mas uma coisa, me da mais prazer na vida do que qualquer outra coisa. nada para mim é mais gostoso, saboroso, me da tesão de comer, me causa alegria, paz, tranquilidade, enfim, boas sensações, do que bolinhos de chuva salgados. na verdade, a massa do bolinho de chuva, sem a adição do açúcar tanto no momento de fazer a massa quanto aquela "chuva" de açúcar em cima.

por muito tempo, me perguntei por que gostar tanto de algo tão trivial e mais ainda, por que  tanto bem estar ao comer os bolinhos, uma sensação que vai além da saciedade ou de ser gostoso, um sentimento que transcende em muito a vontade de comer, que vira uma "experiência" a cada vez que eu como e hoje eu finalmente descobri.

tem a ver com a minha mãe. desde criança minha mãe fazia esses bolinhos para mim. desde sempre, desde que me entendo por gente, esses bolinhos acompanhavam meu café da manhã ou da tarde ou mesmo a noite e consigo me lembrar da trivialidade deles naquela época. nada de especial, apenas algo para se comer de forma rápida. mas depois que eu e ela nos afastamos, e la se vão mais de 15 anos sem vê-la, percebi que os tais bolinhos são a única conexão possível com ela, a que me colocou no mundo, a minha progenitora, minha mãe.

os bolinhos ficaram tão gostosos porque a cada mordida eu revejo minha mãe no fogão, fazendo o bolinho, colocando café com leite para eu tomar, conversando comigo, quando eu era pequeno até que falamos um pouco, mas depois, os assuntos rarearam, nos tornamos pessoas muito diferentes e fomos paulatinamente nos afastando, seguindo nossos rumos, mas eu sentia todo amor de mãe quando ela fazia os tais quitutes e acho, no fim das contas, que é isso que procuro a cada vez que alguém faz esses bolinhos para mim.

porque a massa é sempre a mesma. mas o gosto nunca é igual e mesmo sem ser igual, a sensação de paz, volta. são minutos em que nada me abala, nada me faz infeliz, e me sinto inteiro, abraçado, como se fosse de novo um pivete de 10, 11 anos que acabou de jogar bola na rua e chegou em casa com bolinhos na mesa, quentinhos.

bolinhos de chuva salgados me trazem a infância de volta, mas mas do que isso, me trazem a sensação de que mesmo que por breves momentos minha mãe tenha gostado de mim, porque ninguém faz bolinhos assim tão gostosos para quem não gosta. sei lá, tenho que me apegar em algo e hoje me dei conta de que me apego a isso quando como os danados. a gente sempre tem que ter algo que nos de alento sobre assuntos mal resolvidos né?

sempre tive dúvidas sobre o amor de minha mãe mãe por mim e hoje, esses bolinhos que comi no café da manhã, tão gostosos feitos pela Graziela de forma tão amorosa, me fizeram ter este clique. se é possível ser feliz com suposições eu não sei, mas bora tentar.

é isso.

ouvindo: Elvis Presley

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