quarta-feira, 23 de abril de 2014

A moça da calça amarela


A moça da calça amarela estava como eu no posto de saúde. Mas ao contrário de mim estava sozinha, desemparada, assustada e com medo. Lhe era fácil ler a emoções porque sua frágil figura deixava transparecer de forma clara tanto a dor física como a dor emocional de não ter ninguém e de ser olhada de esguelha como se por ser uma moradora de rua não merecesse estar ali pedindo por um atendimento que minorasse suas dores.

Tive sorte e fui atendido por uma médica mega atenciosa, coisa rara no sistema de saúde público enquanto a moça de calça amarela foi tratada de forma estúpida e quase enxotada do consultório de um desses Bolivianos cretinos que insistem em clinicar no Brasil mal falando nosso idioma.

Ela saiu do consultório chorando e chorando permaneceu praticamente ao meu lado enquanto aguardávamos eu parar colher sangue, ela não sei bem para que. Um choro silencioso, do qual só se sabia ser choro efetivamente porque lágrimas desciam por sua face. Um choro de alguém que não quer incomodar, não quer ser percebido, e mesmo que quisesse ser, ninguém se importaria.

Falar sobre a realidade da saúde no Brasil e triste mas vive-la é ainda pior. Em um cenário como este é de se perguntar como podemos daqui a poucos dias torcer e vibrar por nossa seleção? Com poderemos aplaudir nossos craques e os que chegarão de outros países quando vemos postos de saúde caindo aos pedaços, sem profissionais suficientes, sem medicamentos básicos, sem acomodações, enfim, sem nada, atendendo a um surto de Dengue, doença que só no Brasil prospera e nos envergonha de forma suprema? Por que nos calamos? Por que aceitamos? Por que?

A moça de calça amarela, uma moradora de rua já sem nada não deveria ao menos em uma unidade de saúde achar algum conforto, algum lenitivo para sua dor? Não deveria ela ter alguma prioridade? Eu choro pela moça de calça amarela muito mais do que choro pelo meu pequeno infortuneo pois logo estarei recuperado enquanto ela, sendo tratada com repulsa por um médico que nem em nosso país deveria estar, certamente ja está vagando novamente pelas ruas do bairro pedindo por um prato de comida ou uma nova calça amarela, ou da cor que for.

É isso

Ouvindo: Titãs

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