domingo, 5 de outubro de 2014

Eu, o menino do farol. Eu, "Tristão e Isolda". Eu "Ave Maria" na voz de Maria Callas.


Sim, eu me despi. Fiz algo que achei que jamais faria. E foi libertador. Além de financeiramente vantajoso. Como não vivo minha vida em função do dinheiro e quero mais é que ele se foda ( se não aguenta certas palavras, bebe leite), não é dele , o dinheiro que falarei.

Fui para um farol. Ok era um farol em frente ao plantão de vendas, mas eu fui. Fiquei mais de 8 horas em baixo do Sol, de gravata, ouvindo impropérios mil, gracinhas, palavras de incentivo e até uma cantada. (Pobre e cega mulher!!!!) Por que eu fui ao tal farol?

Temos um produto para lançar e ele precisa estar viabilizado. Sem entrar aqui em detalhes chatos, não estava e ainda não está, mas agora esta quase. O plantão todo tem se esforçado porque é preciso que todos tenham reservas suficientes para o lançamento para que todos possam ganhar seja vendendo uma unidade seja vendendo uma laje. Eentão eu  vi um garoto, daqueles imberbes do post anterior neste farol, abordando clientes. Me senti mal. ENVERGONHADO. Muito envergonhado de ve-lo ali trabalhando e eu conversando sobre o nada. E fui para lá também.

E  com total desasombro, me dei muito bem. Conversei, dei risada, fiz amizades ( não, não é força de expressão, fiz mesmo), e resevei duas unidades levando os clientes diretamente para o plantão. Aos 41 anos, me senti liberto de alguns preconceitos e me senti renovado, pronto pra ser eu , só que de outra forma, ser eu diferente do que fui, ser eu novo e de novo.

Sei que tudo o que me cerca é permeado por uma dramaticidade que outras pessoas não enxergam. Sou uma opéra de Wagner, sou  Tristão e Isolda de longe a melhor delas, não vejo a vida como todos veem, então estou extasiado comigo mesmo agora que baixou a adrenalina e isto não é um post, é uma louvação a mim mesmo que você não tem obrigação alguma de ler se tiver coisa melhor para fazer. Se não tiver coisa melhor que ler isto, pare e se mate!!!! É serio!!!!

Descobri ali, entregando folhetos que anunciavam aptos de 32mts2 com parcelas de R$490,00  que se tenho que fazer isso, embaixo do Sol, tenho que fazer com a mesma virtude com que  Maria Callas emocionava o mundo ao cantar "La Mamma Morta". Nao posso fazer menos que isso. E assim o fiz. Acabei com as pernas doloridas, nas canelas e nas coxas, de tanto andar e ficar em pé. Atravessei a rua um sem número de vezes, repeti o mesmo discurso por mais de zilhões de vezes, fui recompensado. Fui ridicularizado também, tanto por motoristas como por outros corretores. Fui olhado como um lunático, só que eu sou de fato um lunático, então isso não me atinge.

E a medida que entregava os panfletos, via a vida passar. Metáfora trouxa e frouxa! Afinal, no meio de uma Avenida você dizer que vê a vida passar é de uma probreza quase uma indigência mental de dar dó, mas eu vi, e ela passava por mim e sei lá porque entrei em uma espécie de transe, de torpor que só eu mesmo sentia e ao mesmo tempo em que me entorpecia me fazia prosseguir. De verdade, em determinados momentos abria a boca e o discurso saia sem eu querer. O folheto, ganhava vida própria e minhas mãos como as de um Robocop fora de forma se ofereciam ao motorista que pegava talvez com medo de um olhar vidrado que certamente eu lhe oferecia.

Vi que a vida pode ser interessante e pulsar, mesmo quando fazemos algo que não queremos e achamos absurdo fazer. Coloquei minha alma, meu coração, minha vida ali naquele asfalto quente. Senti que precisava fazer não por conta da vergonha inicial ao ver um guri fazendo, mas porque a vida é feita de iniciativas e elas me tem faltado ultimamente. Fiquei surdo ao que me disseram de negativo, fiquei surdo até mesmo as palavras positivas, porque precisava  viver esta experiência apenas comigo mesmo e por mais  dramático que pareça este texto para algo que na verdade é até bem banal, para mim foi  sim, um drama vivido de forma intensa, única. Como um concerto de Maria Callas. Pra quem vive bem abaixo do padrão Montserrat Caballé, na verdade muito mais para Carmem Miranda do que pra uma diva do canto, ter seu momento Callas foi único, emocionante e tão intenso, mas tão intenso como minha Diva cantando "Ave Maria" uma canção que nem posso ouvir muito porque de tão linda na voz dela me faz ter vontade de virar um Marianista de corpo e Alma só para canta-la livremente.

E este é o ponto. Existem experiências que te trasnformam. Estes dias de farol, me farão ser outra pessoa. Ainda não sei como, mas me farão. Nao fui vender apartamentos afinal de contas, não fui ganhar dinheiro ( embora ele venha por inevitável que é quando um corretor bom de verdade faz seu trabalho), mas sinto que fui aquele farol para me transformar, me purificar, para tirar de mim com um banho de Sol, tudo o que de  desnecessário eu carregava até ali. Aquele farol foi minha "Ave Maria", foi um momento tão belo, que a dor, a tristeza com algumas coisas que passei, a preocupação com o futuro, tudo ficou ali, escorrendo pelo asfalto enquanto eu me enchia de uma vigorosa vontade de viver novamente e viver melhor e viver como  se eu fosse "Tristão e Isolda", como se Wagner tivesse me escrito e eu fosse o centro dos aplausos do mundo quando a cortina se fechasse anunciando o fim  de uma panfletagem que pareceu muito mais uma opéra muito bem escrita e inteprepretada com graça e maestria por mim mesmo, que fui a peça e também quem a interpretou.

E só percebi tudo isso horas depois de a adrenalina baixar e eu reservar duas unidades que nao teria reservado esperando clientes no plantão com seu ar condicionado condicionando minha vida!

É isso.

Ouvindo: Maria Callas, minha diva, a que me faz chorar a que me faz melhor!!!


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