segunda-feira, 20 de abril de 2015

Outro poema meu.

                                                                    O dia em que eu morri.

Não houve Sol, não houve chuva, houve apenas um nublado vagabundo.
Não houve choro, não houve riso, apenas um descontentamento misturado com irritação das gentes que tiveram que acompanhar o féretro.
No velório não houve conversa, não houve sequer aquelas piadas que normalmente se contam.
Apenas um silêncio desconfortável, rude, movido pela falta do que dizer (de bom) em relação a mim.

Durante o cortejo, que se desenrolou assim que o dia amanheceu, muitos preferiram não ir com a desculpa pláusivel de que tinham seus compromissos com trabalho entre outros afazeres. No cimo do meu caixão não havia nem se quer uma coroa de flores e creio ter sido melhor, a terra ia cair por cima e elas morreriam sufocadas.
De morto, naquele dia, bastava eu. Não houve um Pastor, Padre, Rabino ou Babalorixá que se dispusesse  a proferir algumas palavras finais, os poucos que foram ao cemitério, minha ultima morada, queriam  que aquela cena se desenrolasse o mais rápido possível.

O coveiro, coitado, jogava terra impiedosamente sobre  meu caixão e embora não soubesse quem eu era, a cara daquelas gentes irritadas com minha súbita morte que as tirou de suas tarefas lhe parecia bem mais ameaçadora do que o meu corpo que jazia ali dentro, sem chance de nada lhe fazer de mal ou bem. E embora já estivesse mais que acostumado com o seu ofício, aquela cena lhe parecia fora de esquadro. Mal sabia ele que minha vida toda havia sido desfocada.Seu final, não podia ser diferente.

Talvez houvessem pessoas que gostariam de ter chorado um pouco que se emocionaram com minha passagem, mas provavelmente a vergonha de chorar por alguém a quem as pessoas tinham tamanha indeferença as tenha freado de forma inapelável e foi melhor assim. Chorar no meu enterro seria de mal gosto. Bom teria sido se alguém ali tivesse sorrido comigo enquanto vivo eu estava.

Acontece que o dia em que eu morri, não foi  o dia em que fui enterrado.  O dia em que eu morri, foi o dia em que eu desisti de lutar. E este dia se deu muito antes do dia em que pessoas mal humoradas e irritadas comigo, pela minha deselegância de morrer sem aviso prévio foram a um velório e posteriormente a um enterro de alguém que sequer esteve vivo para elas em qualquer momento que seja.

O dia em que eu morri, não houve chuva e não houve Sol. Mas houve comemoração. E se ao menos um dia, o dia da minha morte eu fiz algumas pessoas felizes, ele teve então, um propósito nobre.

É isso.

Ouvindo: Madredeus

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