quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Como lagrimas na chuva


Quando Roy, o personagem do espetacular Rutger Hauer diz para Deckard, personagem do apenas ok Harrison Ford, na cena final do Sublime Blade Runner que tudo o que viu, não passam de memórias que como lágrimas na chuva passam desapercebidas até se desfazerem, eu realmente chorei. A beleza da frase é única e tem um lirismo contido nesta frase que fala tão diretamente a quem a escuta que é impossível não se emocionar, não parar para refletir.

É impossível assistir a Blade Runner e não traçar um paralelo com o Deus em quem eu creio. No filme, o criador dos Replicantes não se apieda deles e embora sinta-se pleno de orgulho por sua bela criação, não quer perpetua-la, não quer que ela continue a vagar pela Terra. Por motivos contrários mas que também se cruzam e fundem, Victor Frankstein, o personagem de Mari Shalley também repudiou a sua criação e não a quis vagando juntamente com os outros seres humanos criados por Deus.

Ao contrário do Deus amoroso da Biblia, os homens que na ficção ousaram ser Deus, não se mostraram benevolentes, não tiveram compaixão com as imperfeições de suas criaturas, antes as renegaram e pior, desejaram a sua morte. Criaram de forma irresponsável, seres que lhes emprestariam, fama, glória, riqueza, poder, admiração, mas sem pensar nas consequências que esta criação poderia trazer para as suas criaturas.

A irresponsabilidade humana fica evidenciada de forma inequívoca quando percebemos como estas representações ficcionais de seres humanos simplesmente dão as costas para algo que criaram e exatamente por este motivo, tem total responsabilidade. Fugir da responsabilidade aniquilando ou tentando aniquilar o que se criou e saiu do controle é além de intolerável, revelador de nosso real caráter.  A nossa natureza, apesar de imperfeita, espera sempre comportamentos perfeitos de nossos semelhantes e muito mais ainda exigiria se de fato saíssemos do campo da ficção para o muindo real e nos fosse facultado criar um ser que nos fosse imagem e semelhança.

Exigiríamos caráter reto e ilibado, bons modos, educação no mais alto nível, inteligência que fosse a toda prova, enfim, embora sejamos nós mesmos imperfeitos e dependentes do amor e da bondade do nosso Criador, se criadores fossemos agiríamos sem qualquer traço de piedade ou benevolência para com nossas criaturas, embora a matriz de onde esta criatura se fez seja ela mesma oca por dentro, sem nada de bom para oferecer.

Como lágrimas na chuva, as lembranças de Roy se foram e ele morreu. Nada restou. Elas se confundiram entre o que era realidade e o que era apenas lembrança implantada por seu criador em sua mente. Deus, o nosso criador, nos dá completa liberdade para que vivamos a nossa vida e a partir dela possamos organizar nossas lembranças, mas mesmo para nós, se não vivermos de forma correta, integra, ao final da vida, teremos apenas lembranças que se desfarão em nossa memória como lágrimas na chuva, pois não terão a profundidade  que uma vida vivida de forma exitosa exige.

Roy era apenas um replicante e principalmente, personagem de ficção. Nós somos antes de mais nada, seres reais, pensantes que podemos a qualquer momento que desejarmos mudar o rumo de nossa vida. Uma vantagem assim, não tem preço, uma perspectiva como essa, faz com que nossas lembranças possam ser bem mais que lágrimas na chuva.

É isso.

Ouvindo: A trilha sonora completa de Blade Runner

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