Claro que "indo para o norte" é apenas um metáfora tirada de uma canção para suavizar o fato de que ninha mãe esta morrendo. Eu fico aqui trabalhando como um louco, procurando pensar em tudo, em qualquer coisa que seja, sem deixar minha mente entrar em modo descanso porque não quero pensar que ela vai morrer mas apenas um pensamento me ocorre o dia todo e me assalta nas madrugadas: Minha mãe esta morrendo de câncer e não há nada que eu possa fazer.
Sei que as pessoas podem pensar que eu sou insensível por não estar ali, ao lado dela, mas eu não consigo. Desculpe, mãe, desculpe mundo, mas não consigo. Saber que minha mãe tem câncer é absolutamente devastador para mim ainda mais porque eu simplesmente não consigo conversar com ninguém sobre isso. Com absolutamente ninguém. Se eu tenho esperança que suas sessões de quimioterapia a ajudem? Sei exatamente como minha mãe maltratou seu corpo ao longo de sua vida e o quanto este comportamento cobra seu preço agora, então eu não vejo muita saída. Homem de pouca fé? Talvez.
Venho tendo uma verdadeira fixação por astronautas ultimamente, sobretudo pela solidão do espaço. Não sei bem porque, não sou psicologo afinal de contas mas acho que tem a ver com poder ver "do alto" o que realmente acontece aqui no solo e sobretudo com velocidade da luz que me permitira piscar e estar onde quer que eu quisesse. Nem sei porque mencionei isso no post afinal de contas, mas o fato é que sinto que se desligar minha mente de qualquer tipo de pensamento vou desmoronar e não posso.
Neste momento, escrevendo este post com o qual ninguém se importa, lembranças da minha infância vem a tona. Não gosto de lembrar da minha infância pois ela não foi uma infância que crianças saudáveis e vencedoras costumam ter. Eu gosto da criança que fui, tenho um enorme carinho por ela mas as pessoas que me cercaram, com exceção de minha mãe e poucos familiares não foram bacanas comigo.
Professores, padrastos (assim mesmo, no plural), adultos em geral e outras crianças, ao menos a grande maioria delas não tinham por mim afeição e minha mãe, coitada, minha referência estava sempre ocupada demais buscando nosso sustento. Existem três lugares onde certamente minha mãe estaria em sua vida, um plantão de hospital, uma "casa de família" como se falava antigamente ou em um bar. Eu tinha um orgulho insano ao ver minha mãe toda de branco indo para o hospital cumprir plantões como enfermeira competente que era.
Eu tinha também um orgulho que só hoje entendo como tal ao ver ela chegar pela manhã em casa e ir direto fazer faxina em alguma casa desas de família para complementar sua renda. Acho incrível como ela não tinha vergonha de fazer o que fosse preciso dentro dos seus padrões de dignidade para não falta nada a mim e minhas irmãs. Por outro lado o terceiro local me enchia de tristeza. Perceber minha mãe alcoolizada sempre foi algo que acabava com meu coração. Hoje, esses abusos se traduzem em um câncer que esta aos poucos a devastando.
Eu não consigo falar disso com quem quer que seja e fico aqui entre remoer lembranças e imaginar o futuro próximo quando receberei a noticia de sua morte. Tenho muito medo desse dia. Sou um adulto de 46 anos, pai, maduro, mas receio que neste dia volte a ser aquele garoto inseguro e mais envergonhado que qualquer outro com qualquer coisa.
Todo mundo tem sua zona de conforto. A minha é quando estou vendendo. Me sinto tão pleno e superior a qualquer pessoa que se disponha a negociar comigo que gostaria que as "mesas" não acabassem nunca. Concentrado em vender eu me transformo em alguém realmente poderoso, quase que invencível. Mas quando a mesa acaba, eu penso minha mãe e que ela esta indo para o norte em uma velocidade muito maior que a que posso aceitar.
Minha mãe esta indo para o norte e não posso fazer nada quanto a isso. A vida nos reserva acontecimentos que apenas podemos aceitar da melhor maneira, não nos é dado o direito de lutar contra eles e este é um desses. Um dia, serei eu a ir para o norte e ok, a vida é assim mesmo, no final a gente morre. Mas no caso da minha mãe, não estou pronto para lidar com isso. Ela vai para o norte e eu, quando isto acontecer, não sei para onde vou. Por mais que eu queira aparentar uma fria normalidade sobre o acontecimento horrível que é perder quem se ama, eu me sinto cada dia mais amedrontado, pequeno e impotente. A vida é assim. Mas não deveria.
É isso
Ouvindo: Elton John
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