domingo, 11 de agosto de 2019

Sempre Tive Duas Botas (E Outras Historias)



Hoje, dia dos pais, seria injusto se não falasse de minha mãe, que foi meu pai e mãe. Dona Alexandrina, esta indo para o norte, mas ainda esta por aqui e preciso falar do quanto ela rebolou (sentido figurado que fique claro) para me dar tudo o que me deu.

As botas do título me vieram a cabeça alguns dias atrás no banho. Emagreci tanto, que olhando para baixo vejo meus pés perfeitamente o que a  alguns anos atrás era impensável, dado o tamanho da barriga que embora ainda seja grande, esta bem menor. Mas olhando para eles lembre-me do "defeito" que carrego desde que nasci nos coitadinhos. Parecem pés de sei lá, pato, talvez, enfim, tem um shape estranho pra dizer o mínimo e feio, para ser realista.

Minha mãe, por ser enfermeira (entre outras ocupações) desde que me entendo por gente correu para cima e para baixo para determinar o que seria melhor em relação aos meus pobres pés uma vez que claramente não eram comuns. Consultas a ortopedistas eram normais e em uma dessas, o ortopedista indicou a minha mãe que eu deveria usar botas ortopédicas pois melhorariam a forma  com que eu pisava ou algo do tipo.

Lembro-me como se fosse hoje que minha mãe com a receita do médico me levou a Ortopedia Palmipé, sei lá porque me lembro do nome, mas me lembro perfeitamente e lembro-me mais ainda de que ela saiu dali chorando quando lhe disseram o preço das botas. Minha mãe, Enfermeira em dois hospitais não se furtou a passar a fazer faxinas para compara as tais botas. Por que no plural? Ela achava que eu precisava de uma para o dia a dia, e uma para ir a lugares especiais. Uma preta e uma branca. E achava que as botas pediam roupas diferentes, que combinassem com elas. Coisa de mãe né?

Durante vários anos eu usei essas botas. Cada consulta de avaliação eu tinha a esperança de ser dispensado de usa-las mas foram anos até a libertação. E durante todos esses anos, minha mãe me mantinha com duas botas, sempre novinhas, sempre polidas, sempre prontas para serem usadas. Ela sabia, conforme me disse um dia, que eram sapatos feios, e então eles tinham que estar o mais alinhados possíveis para o meu conforto e meu visual.

Aos quatros anos tive pneumonia, daquelas bem fortes e durante a recuperação no hospital em que fiquei internado minha mãe me levava gibis. Fui alfabetizado por ela naquele mês que fiquei ali. Sai do hospital curado e sabendo ler o que me apresentassem para ler e a escrever o que me pedissem. Isso foi um problema. Aos sete, fui para e escola  e na classe nenhum outro aluno sabia ler e escrever. Eu me recusava a fazer bolinhas, minhoquinhas, círculos e quando tentaram me ensinar o assento agudo com o lance do grampinho da vovó tive o primeiro surto entre tantos do meu parco período escolar. Lá estava minha mãe, pronta a me defender da diretora e da professora que se sentiu verbalmente agredida.

Quando aos 8, 9 anos, prometeram tocar uma música no rádio e pararam a música para anunciar a Suíssa, Relojoaria  famosa naquele tempo e eu em fúria destruí o rádio de casa a marteladas até não sobrar nada, minha mãe me deu uma surra, me levou ao psicólogo. Todos os outros habitantes da casa me evitaram por quase um ano mas ela estava lá, ao meu lado.

Sim, eu sei que ela gostava mais de Fernanda, mas é totalmente aceitável, afinal Fernanda foi em seus poucos anos de vida uma pessoa muito melhor do que eu jamais serei. Minha pequena irmã era um ser mais que iluminado, era talvez a própria iluminação, jamais mereceu morrer tão cedo. Tivesse eu partido, esse blog chato não existiria.

E quando fui acusado de espancar um garoto, (algo que não fiz) até deixa-lo inconsciente, minha mãe olhou-me nos olhos e pediu a verdade. Eu disse que ão havia sido e eu e ela tal qual uma delegada não descansou até provar a toa a rua que eu nada tinha com aquilo. E fez as mães que me acusaram pedirem desculpa formalmente.

Minha mãe foi meu pai e foi minha mãe. Eu queria ter conhecido meu pai, mas Deus me deu a dona Alexandrina que mesmo com seus inúmeros defeitos é alguém que foi minha mãe e pai. Obrigado, mãe! Feliz dia dos pais para você que me ensinou a gostar de música boa, a ler, a escrever, adizer o que eu penso sempre e a não ser hipócrita.

É isso.

Ouvindo: Sei lá por que, A-ha

Um comentário:

Neuzinha disse...

Eu te conheço há tantos anos, mas não peguei essa fase das botinhas. Você sempre foi uma pessoa muito inteligente e capaz Davi. Sua mãe devia saber disso e por isso deu o seu melhor para que se tornar um homem de bem! Você já retribuiu a ela à altura com certeza, pois Deus te susteve para que cuidasse dela como ela cuidou de você! Grande abraço à sua Pãe!