Eu não sei chorar. Não pelo que realmente importa. Choro quando vejo um filme, choro quando leio algo muito bonito e bem escrito, choro até em comerciais de TV que façam alusão ao dia dos pais. Choro quando vejo injustiças sendo perpetradas, quando vejo pessoas indefesas sendo atacadas sem poder revidar. Choro quando uma música é tão bela e tão bem interpretada que não vejo outra saída além de me debulhar em lágrimas. Sim, eu choro. Por muitas coisas eu choro. Mas não sei e não consigo e talvez nunca aprenda a chorar por mim.
Se eu sou o injustiçado, eu não choro. Se eu sou o agredido, revido, mas não choro. Se me machuco, fisicamente falando, também não choro. O choro não funciona para mim. Eu só sinto uma imensa raiva. Uma raiva que me perpassa o corpo de ponta a ponta e me faz querer quebrar objetos ou a cara de quem estiver por perto, mas não consigo chorar. É como se minhas emoções não fossem dignas de choro, seja meu para mim mesmo seja dos outros por mim. Chorar por mim é algo minha mãe não me ensinou dentre tantas e tanas coisas que só sei graças a ela. Não que eu a esteja culpando, mas eu gostaria as vezes, do alívio que o choro traz.
Outro dia pela manhã eu vi uma mulher no trem sentada na minha frente. Ela chorava litros e mais litros e foi assim de Osasco até Pinheiros. Curiosamente, ela desceu comigo e parou de chorar. Olhei em seu rosto e vi a face do alívio. Vai uma pessoa que se esvaziou por ter chorado e ali, se eu soubesse chorar, teria chorado de raiva de mim mesmo.
Hoje eu precisava chorar. Precisava ter sentado no chão com os braços entrelaçando os joelhos e a cabeça afundada ali enquanto meus olhos pareceriam uma cachoeira de lágrimas. Eu precisava ter derrubado um aquífero Guarani em forma de choro e precisava que ele fosse um choro sentido, cheio de soluções, quase teatral mas também real, sincero com a sinceridade que só a dor traz. Mas não consegui.
Do aquário onde fico contemplei o transito se desenrolando desenfreado, as pessoas comprando carnes para o feriado de amanhã no açougue chique em frente ao plantão e vi os funcionários da obra tão aplicados em seus afazeres que creio que nem se lembravam que eles existem, que são pessoas, que tem sentimentos. Corriam como formigas ordeiras e aplicadas abrindo um buraco cada vez mais fundo e enquanto outra turma de formigas jogava concreto em outro lado deste mesmo buraco. Um balé sincronizado porém nada poético. Repetitivo, sem emoção e enquanto eu olhava eu explodia de desejo de que ao menos uma gota caísse dos meus olhos, mas apenas a raiva crescia e ainda cresce no dia de hoje.
Não sei quanto de raiva posso armazenar dentro de mim mas sei que se houvesse medição para isso seria muita raiva, seria uma concentração que poderia caso fosse explosiva botar o bairro do Morumbi para voar com suas casas que parecem tão luxuosas quanto assustadoramente solitárias e vazias.
Eu hoje quis chorar e não consegui. Ainda quero, mas não conseguirei. Quando me deitar para dormir, meu peito em chamas vai se acalmar porque afinal, o dia terá acabado e outro vai se iniciar enquanto eu durmo. Minha mãe não me ensinou, mas eu quis chorar. Por mim, por minhas frustrações, por minhas derrotas, por meus fracassos, por tudo que eu não alcancei e sei que não alcançarei.
Eu quis chorar, Não deu. Paciência.
É isso.
Ouvindo: Commissioned